A construção do palácio Fonte da Pipa data da segunda metade do século XIX e sempre pertenceu a particulares. É uma obra inacabada que foi construída, vendida e depois confiscada pelo Banco do Algarve, em motivo da crise financeira de 1929, à família que o comprara. Muito tem sido fotografado e visitado. Fica ali, no meio do nada, longe da estrada, depois do portão improvisado, cerrado a cadeado, e do muro branco de cimento. Longe de toda a movimentação vai sendo invadido pela natureza, tomado por ela. Resiste, apesar de tudo, com as suas paredes intactas, pintadas de cores ténues. O abandono e o fogo não lhe conseguiram ainda tirar a imponência, a tranquilidade, nem o charme romântico das suas cores.
  
                                         

Ardeu no início deste ano. Até lá permanecia de telhados intactos, a fazer lembrar os palácios das princesas. Agora resistem-lhe as paredes e no chão estão os restos, os pedaços que lutaram contra as chamas e perderam, caindo vencidos numa amálgama de cinzas, de tudo, de nada. Aos pés das paredes de frescos detalhados, encontram-se agora pregos, madeira intacta, madeira queimada, tijolos e telhas. Vê-se uma amálgama de caos assustadora e triste. E quando lá cheguei fiquei com a sensação de que já deveria ter ido antes, numa altura em que o pudesse ver pleno e não tão periclitante e inseguro.  



Não me adiantei a entrar. Visitei-o num dia de ventania forte, quando o sol já ia baixo e pintava o céu com as suas cores rosadas de inverno. Estava eu, sozinha perante toda a sua instabilidade, de máquina em riste, a pouco menos de um quilómetro da estrada. Ninguém, dos que estavam comigo, quis pular o muro e eu fui a correr estrada abaixo, contente porque ia finalmente descobri-lo. 


Já lhe tinha percorrido todo o exterior quando me preparava para entrar. Rompi cuidadosa pela porta principal, mas as traves de madeira que tinham resistido cadavéricas, enegrecidas e frágeis no cimo do detalhado nu, abanavam com o vento e ameaçavam partir-se para cima de mim. Percebi que estar de olho no que se passava por cima da cabeça e, em simultâneo, ao que estava a pisar, era demasiado arriscado. Havia pregos, tábuas e entulho por todo o chão que os meus olhos conseguiam espreitar. 


Havia também o silêncio, uma ausência quase completa de som. Eu já me tinha habituado ao vento a rastolhar nas copas das árvores, por isso para mim, além de tudo, havia a ausência de som, de movimento, de gente. E heis que subitamente o mesmo foi quebrado por uma das persianas de madeira do primeiro andar a bater, atirada pelo vento contra os ferros no rebordo da janela. Não admira que digam que está assombrado, porque mesmo agora, tão corrompido pelas circunstâncias, parece ter vida própria e falar connosco. Decidi que estava vencida, que era perigoso entrar, que o vento estava mais frio, que o sol já desistira de por ali andar. Voltei para junto dos meus e olhei para ele uma última vez antes de me afastar. Vi-o deixar-se estar ali num misto de impavidez e tempestuosidade, no meio dos seus jardins abandonados.   


Deixou-me um pouco melancólica a edição destas fotos. Tenho pena que um local tão bonito tenha ficado assim, tão derrotado. Mas vá, vou fazer uma transição brusca de assunto porque a conversa já vai longa: já repararam que finalmente temos um logo para o desafio? A fantástica Mafalda do Nuts For Papers, também conhecida como A Outra Mafalda, fez-nos este logo TÃO giro! Obrigada! É sempre bom poder contar com a tua criatividade. :) 
 Agora vamos lá espreitar o que andaram a preparar as restantes "off sighters" deste mês?

12 comentários

  1. Vânia, este foi sem dúvida o teu post que mais gostei de ler neste Off Sight: não só pelas imagens, pelos detalhes suspensos, pela vida congelada que captaste, que parece ser a vida própria do palácio, mas também pelo teu texto. Estive de respiração suspensa pelo perigo e mistério que foste descrevendo!

    De facto é uma pena ver locais assim ao abandono. Nada está como as outras fotos que vimos, e é mesmo uma pena, esse lugar era magnífico - e continua a ser, com uma atmosfera bem mais assustadora, verdade.

    Jiji

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  2. As fotos estão fantásticas bem como texto e o local parece lindíssimo, pena este património estar assim ao abandono... Gostei muito, parabéns!

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  3. Que sítio tão bonito. Ah, e para não variar, belíssimas fotos e belíssimo texto!

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  4. Esse palácio é qualquer coisa! Assim que vi no grupo que ias falar sobre ele fiquei logo com as orelhinhas em pé!
    Até dói na alma ver como esses sitios acabam assim aos pedaços... As tuas fotos estão lindissimas e o teu texto maravilhoso! Parabéns pelo teu magnifico trabalho.
    Beijinho

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  5. Nascida e criada em Loulé já iuvi milhentas vezes falarem deste palacio so que nunca consegui companhia para vir comigo. Vânia queres voltar? Desta vez sem vento por favor hehe

    Para variar adorei ler te, opa parecia mesmo que estava a viajar por esse local! Obrigada por trazeres factos historicos, já deu para aprender umas coisas.
    Apesar das dificuldades tens aqui fotografias de cortar a respiração, gostei muito da da porta <3 tenho pena de ter ardido e acredito que com tantas pessoas a visitarem o sitio esteja cada vez mais degradado. Ainda assim quero ir!
    Parabéns miúda, foi o teu off sight que mais gostei até agora =)

    ~*Viver a Viajar*~

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    1. Também fiquei com muita vontade de voltar lá, desta vez acompanhada, com mais tempo, e sem vento! Quando vieres apita que combinamos isso. :)

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  6. Ouvi falar no que aconteceu ao Palácio, mas não sei onde fica. É mesmo bonito, é uma pena estar tão degradado!

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  7. Ai Vânia Vânia, como adorei este teu post! Adorei TUDO :D as fotografias, a história do palácio, o relato da tua visita. Imagino o susto que apanhaste com a persiana a bater com o vento. Se fosse comigo tinha borrado a cueca AHAH! E é mesmo pena que um sítio como esse esteja abandonado. É tão bonito e tem tanto potencial.

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  8. Adorei este teu texto! Transporta-nos mesmo para o local, e para o que estavas a sentir no momento. Parecia que também eu estava lá, a teu lado. É sempre uma pena ver locais tão bonitos ao abandono... Mas acho que esse ar pouco cuidado também lhes dá um certo encanto, não sei explicar porquê.

    Mundo Indefinido

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  9. Venho finalmente ver o teu trabalho! Gostei imenso das fotografias, sobretudo da 6 e da 7. A primeira fotografia também é muito bonita! A casa tem uma cor muito bonita e gosto imenso do contraste com o céu azulinho! Não conhecia o Palácio nem a história e é no Algarve! Tenho de o visitar!

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  10. Tive muita dificuldade em mentalizar que deixaram um palácio destes degradar-se assim!
    Tenho a certeza que seria um palácio tão bonito e romântico!
    Por mim poderias continuar com a história deste palácio, porque amei a descrição e saber um pouco da história! Adorei cada detalhe das tuas fotos!!
    Um beijo

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