Off sight | Córdoba das pessoas
31.8.17
Dizem que agosto é o mês mais tranquilo em Córdoba. Compreendo que deva ser, porque ninguém, no seu perfeito juízo, deveria querer ir para uma cidade situada na profunda e esturricante Andaluzia, naquele que é, supostamente, um dos meses mais quentes do ano. Ninguém excepto eu e outras tantas pessoas que, em boa verdade, não me pareceram assim tão poucas (e nem tão loucas, vá), e que enchem a cidade de vida um pouco por todo o lado.
Vou deixar para depois falar-vos dos dias fantásticos que passei por lá e dos locais que visitei, mas adianto que é uma cidade linda, cuja história e cultura vale a pena conhecer, e cujas raízes estão muito bem visíveis e preservadas.
Por lá circulava gente de muitas nacionalidades diferentes e cruzei-me com nipónicos, europeus e até mesmo gente do médio oriente e América do norte. Ainda que não estivesse em mente aproveitar esta viagem para preparar o ensaio fotográfico deste mês para o off sight, parece-me que teria sido difícil fotografar sem ter sempre alguém à frente da minha lente. Além disso, as cidades têm sempre mais sentido quando nelas se incluem as suas pessoas.
Só quando em casa revi as fotos é que refleti sobre os contrastes da cidade. Aí percebi-lhe os jogos de luz, que me atraíram, ainda que de forma inconsciente. Face à cor areada dos seus edifícios sob a luz quente do sol, as sombras das ruas estreitas, dos arcos, pátios, janelas e portas de influência árabe, captaram a minha lente. O que me cativou nas pessoas, foi a sua necessidade de transitarem entre a sombra e o sol, ou até mesmo de se demorarem na primeira. Vi gente a refrescar-se, a caminhar nas ruas quentes, a demorar-se no interior fresco da Mesquita, a brincar, a proteger-se do sol e a trabalhar, tudo bafejado por um rendilhado misterioso de culturas diversas.
Pela primeira vez tive uma situação constrangedora por estar a fazer fotografia de rua, derivada daquilo que não foi, no meu entendimento, mais do que um mal entendido. No segundo dia em Córdoba, um senhor achou que eu estava a fazer um retrato dele e da mulher, e começou a disparatar comigo porque ela não podia ser fotografada, já que era muçulmana. A senhora também pensou que eu estava a fotografá-la e aparentemente fez-me sinal a dizer "não" (segundo me contou o Sérgio, que estava a observar-nos de longe), mas eu não vi porque tinha a máquina na cara e não estava realmente focada neles.
Quando me apercebi que estavam a falar comigo tentei explicar que estava tudo ok, mostrar-lhe as fotos, mas ele não me deixou explicar e só dizia para apagar, que não podia fotografar sem pedir autorização e aquilo que todos já sabemos. Isso deixou-me sem vontade de fotografar nesse dia e foi uma quebra brutal de inspiração. Por ironia do destino, desde que tinha pegado na máquina de manhã, e perante uma cidade tão cheia de gente, andava justamente a debater-me com a questão do direito de imagem que nos assiste a todos. Como queria publicar as fotos no blogue andava a ensaiar maneiras de fotografar as pessoas sem as expor demasiado, até porque me apetecia tirar fotos diferentes, e achei que precisava de desconstruir o tema "pessoas".
Perante esse exercício, o que me deixou chateada na situação foi que o senhor me tivesse acusado de algo que eu própria estava a desafiar-me a contrariar, mais do que em qualquer outro dia em que tenha saído de casa para fotografar. A maioria das fotos desta publicação foram justamente tiradas nesse dia, pois nos seguintes decidi esquecer-me do off sight e focar-me noutros detalhes da cidade. Não me apetecia nada voltar a ter chatices com pessoas.
Vocês também se debatem com a questão da privacidade ao fotografar pessoas? Alguma vez tiveram alguma situação constrangedora devido a isso? Que estratégias utilizam para evitar estes problemas (além de pedir autorização para fotografar alguém, claro!)? Contem-me tudo, tudo e tudo e depois não se esqueçam de ir cuscar o que terá inspirado as minhas off sight partners neste fantástico mês de agosto, sim? :)