Off Sight | O Hotel Monte Palace em São Miguel
30.4.17
Quando cheguei à grande sala do rés-de-chão vi-lhe o chão assim, colorido e reluzente sob uma capa de água. A luz vinha de cima, trespassando sem impedimentos o tecto. Não lhe sabia a história e imaginei-o como o piso estranhamente resistente do abandono daquele lugar. O verde, azul, amarelo e branco dos seus padrões pareciam a única mescla de cor por ali, por entre altas paredes de betão. Brinquei com ele durante um bocado e com o reflexo que me devolvia, mas na verdade não o analisei com olhos de ver e nem o percebi como um tapete.
Só no regresso a casa descobri que aquele padrão no chão respira uma história mais recente do que o hotel onde se situa. Ele conta-nos sobre o artista catalão Javier de Riba, que decidiu aí pintá-lo, como se de uma segunda pele se tratasse. É, na verdade, parte de um movimento artístico e uma tentativa de dignificar aquele lugar e a sua história. Devolve-lhe, no fundo, alguma da sua imaginável vaidade.
Tanto quanto li, nasceu demasiado cedo, este hotel. Abriu portas em 1989 como a primeira unidade hoteleira cinco estrelas da Ilha de São Miguel. Fechou dois anos depois, falido e sem hipóteses de sobreviver, numa altura em que o turismo nos Açores não justificava a sua existência. Foi, na verdade, vítima do seu tempo e das circunstâncias. Os preços elevados das suites, de frente para a paisagem, limitaram-lhe a procura. O nevoeiro intenso e constante do miradouro ditou-lhe o fim. Não deveria estar plantado ali, no cimo da montanha, mas não autorizaram a sua construção no vale das Sete Cidades. Apesar da quase perfeita simbiose com a montanha à sua volta, morreu talvez mesmo antes de ter existido.
Fotografá-lo foi desafiante. É escuro e húmido e está cheio de gente a circular. A luz e o enquadramento mudam a cada nova divisão. As pessoas que o visitam vão deixando marcas que apetece captar, seja pelos objetos esquecidos, pelas paredes rascunhadas, ou pelo corropio constante porta-a-porta. Percebi a dinâmica entusiasmante dos traços da sua arquitectura estranhamente contemporânea e foquei-me nisso a partir de vários ângulos. Persegui-lhe os focos de luz porta-sim, porta-sim, a irromper pelos longos corredores. Entusiasmei-me, e muito, com os reflexos de água, um pouco por todo o lado. É como se captassem a natureza lá fora e a puxassem para dentro. Tem vida, apesar de tudo. Tem uma história fascinante e é, sem dúvida, um sítio de paredes firmes, feitas para durar. Acredito mesmo (ou quero muito acreditar) que um dia alguém há-de dar-lhe um novo sentido. Enquanto tal não acontece mantém-se ali, como uma carcaça de interior completamente pilhado, a mirar a Lagoa das Sete Cidades.
Que locais abandonados terão andado a fotografar as restantes Off Sight Girls este mês? 'Bora lá clicar para ver! :)
Que pens, tem tanto potencial. Belíssimas fotos Vânia.
ResponderEliminarSim, tem mesmo muito potencial!
EliminarQue fotos brutais, Vânia! As duas primeiras agarraram-me mesmo. Já não sei quantas vezes vi imagens desse lugar e o quis visitar. Parece uma mistura de viagem aos anos 80 com um portal para um presente esquecido, que não faz qualquer sentido no lugar em que está. É como dizes, veio antes do tempo...mas bom. Excelente trabalho!
ResponderEliminarJiji
É mesmo isso que se sente, um mix de passado, presente, futuro... acho que arquitectónicamente tem um aspeto até bastante contemporâneo, com tantas linhas direitas. E está projetado de forma a parecer que vai entrar pela montanha adentro. Enfim, é mesmo uma pena!
EliminarQue belas fotos e que triste um hotel desse tamanho abandonado assim!
ResponderEliminarBeijos e uma excelente semana!
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Sim, é mesmo uma pena!
EliminarJá estive aí nesse sitio!!! É realmente impressionante como algo com essa localização e uma vista dessas (de bradar aos céus) esteja assim... Pode ser que agora, com o aumento do turismo nos Açores, alguém "lhe pegue" e lhe dê uma nova vida.
ResponderEliminarDizem que está á venda por 1,5 milhão de euros. Tem uma localização que não é muito fácil porque muitas vezes está nevoeiro, para além da humidade excessiva. Vamos ver o que acontece!
EliminarDeu-me uma tristeza imensa quando o visitei. Apenas fiquei pelo exterior e não entrei. Falei com uma senhora que estava a vender gelados, para saber mais da história do hotel e depois à noite ainda fui à net pesquisar mais sobre o hotel. Foi triste o fim que o hotel teve e agora naquele estado, tem muito mais visitas do que alguma vez teve enquanto funcionou. Ironias do destino!!
ResponderEliminarAi Vânia adorei a arquitectura do hotel e fica situado num lugar tão bonito com a natureza toda à volta! Pois hoje em dia com os voos low cost se calhar até haveriam pessoas capazes de passar ai uns dias. Realmente dois anos não é muito, uma vida bem curtinha.
ResponderEliminarA tua primeira foto está super bem conseguida e das escadas levam-nos para outro mundo. Gostei muito!
Caramba, Vânia! O Off Sight foi longe! Ehehehe nem acredito que descobriste um hotel abandonado nos Açores, mas amei as fotos, parabéns! :D
ResponderEliminarJoan of July
Fiquei maravilhada com a paisagem da 5ª foto!
ResponderEliminarTens razão, se fosse criado mais tarde teria provavelmente outro destino, mas devo dizer que quem o idealizou tinha uma mente muito a frente! Que entusiasmo estar ali, adorei!
Bonitas fotos...é pena lugares com esse estarem ao abandono...
ResponderEliminarIsabel Sá
Brilhos da Moda